quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Ostra feliz não faz pérola

"Ostras são moluscos, animais sem esqueletos, macias, que são as delícias dos gastrônomos. Podem ser comidas cruas, de pingos de limão, com arroz, paellas, sopas. Sem defesas - são animais mansos - seriam uma presa fácil dos predadores.
Para que isso não acontecesse a sua sabedoria as ensinou a fazer casas, conchas duras, dentro das quais vivem.
Pois havia num fundo de mar uma colônia de ostras, muitas ostras. Eram ostras felizes. Sabia-se que eram ostras felizes porque de dentro de suas conchas, saía uma delicada melodia, música aquática, como se fosse um canto gregoriano, todas cantando a mesma música. Com uma exceção: de uma ostra solitária que fazia um solo solitário... Diferente da alegre música aquática, ela cantava um canto muito triste... As ostras felizes riam dela e diziam: "Ela não sai da sua depressão..." Não era depressão. Era dor. Pois um grão de areia havia entrado dentro da sua carne e doía, doía, doía. E ela não tinha jeito de se livrar dele, do grão de areia. Mas era possível livrar-se da dor.
O seu corpo sabia que, para se livrar da dor que o grão de areia lhe provocava, em virtude de sua aspereza, arestas e pontas, bastava envolvê-lo com uma substância lisa, brilhante e redonda. Assim, enquanto cantava o seu canto triste, o seu corpo fazia o seu trabalho - por causa da dor que o grão de areia lhe causava."
- Rubem Alves

Lembrei desse texto do Rubem Alves lendo o delicado blog http://parafrancisco.blogspot.com/. Este blog foi criado por uma mãe, após perder o pai do seu filho nada menos que 2 meses antes de Francisco nascer. A intenção era, de alguma forma, aliviar a dor da perda registrando toda a história de amor que os pais de Francisco viveram. Um meio de apresentar ao filho o pai que ele não teve a chance de conhecer.
Uma dor que, como a ostra, Cristiana soube transformar lindamente em pérola...

Um comentário:

Adri disse...

Eu também tenho esse blog nos meus favoritos! Adoro o que ela escreve...

Um dia eu te conto minha teoria do complexo de ostra.

Beijos e bom fim de semana